17 janeiro, 2007

Basta de hipocrisias!

A menos de um mês do referendo sobre a despenalização do aborto, cabe-nos a todas e todos reflectir responsavelmente sobre o futuro que desejamos para a nossa sociedade... Se desejamos uma sociedade que continue assente numa cidadania exclusora e punitiva para com as mulheres... ou, pelo contrário, o dia 11 de Fevereiro irá ser um marco na construção de uma cidadania mais inclusiva que garante o direito à mulher de optar, com base numa decisão responsável e livre?! A actual legislação, que criminaliza o aborto, condena milhares de mulheres a um caminho de clandestinidade associado ao risco de saúde e das suas próprias vidas, onde a dignidade está ausente. É uma lei ineficaz na resposta ao aborto clandestino, realizado na maioria das vezes em situações que colocam a vida das mulheres em risco, quer a nível da saúde física, como psicológica... levando mesmo a casos de morte. É uma lei hipócrita que leva as mulheres que recorrem ao aborto clandestino à barra do tribunal, numa pena que pode ir até aos três anos. Aliás, em Aveiro decorre um julgamento onde o Ministério Público pede a pena máxima, 3 anos de prisão, para as mulheres. É uma lei que criminaliza e estigmatiza as mulheres, devassando a sua vida privada em praça pública, humilhando-as e marcando-as socialmente, como criminosas. É uma lei que perpetua as desigualdades sociais, pois são as mulheres com menos poder económico que se sujeitam ao aborto clandestino em situações precárias, realizado muitas das vezes por “entendidos/as”, tendo como desfecho as urgências dos hospitais, ou em casos extremos a morgue. Aquelas que possuem outros recursos económicos recorrem a clinicas privadas, nacionais ou na vizinha Espanha, onde lhes são oferecidos outros cuidados de saúde em troca do pagamento de uma quantia que vai desde o valor do salário mínimo. São as mulheres com menos poder económico que são empurradas para o aborto clandestino sem condições, sem cuidados médicos e para o aborto auto-infligido... tornando-se um problema de saúde nacional! É uma lei que não reconhece as mulheres como cidadãs capazes de decidir sobre a sua própria vida, colocando-as hierarquicamente num patamar valorativo inferior ao embrião. É uma lei que remete a mulher cidadã para a função de reprodutora e de mãe, não lhe garantido o direito a várias opções de escolha, onde uma será a ter o direito a uma maternidade desejada! Basta!! Basta a uma lei punitiva e criminilizadora das mulheres! Basta de tratar as mulheres como seres menores, incapazes de tomar uma decisão responsável sobre as suas próprias vidas! Basta de hipocrisias e usar o argumento da vida, quando o valor da vida das mulheres lhes é amputado! Basta de hipocrisias e usar o argumento da vida, assente numa moral que se considera superior e que joga com este valor consoante os seus fins. Afinal qual é o valor da vida? A actual lei considera que quando a gravidez resulta de uma violação ou se o feto é portador de deficiência, que a interrupção da gravidez é possível num quadro de legalidade... não terão estes mesmos fetos (e usando o argumento absoluto da vida) direito à vida? Ou a vida passa a ser um critério de selecção? Afinal qual é o valor da vida? Basta de apontar o dedo! Basta de julgar! Basta de cegueiras, de negar e de silenciar um problema de saúde pública que é o aborto clandestino! O SIM! pela despenalização do aborto até às 10 semanas tem como principal objectivo erradicar um problema que é de todas e todos: o aborto clandestino, que está presente na nossa sociedade! O SIM! pela despenalização do aborto exige a descriminalização das mulheres que decidem interromper uma gravidez, num quadro de segurança e legalidade, em estabelecimentos de saúde devidamente autorizados! O SIM! pela despenalização do aborto exige a adopção de uma visão integradora da saúde sexual e reprodutiva informada e responsável que permita prevenir futuras gravidezes indesejadas! O SIM! pela despenalização do aborto exige uma mudança legislativa que implica uma mudança emancipatoria do conceito de cidadania! O SIM! pela despenalização do aborto, não quer dizer “ser a favor do aborto”, mas sim o respeito pela decisão das mulheres de decidirem interromper uma gravidez até às 10 semanas, quando não se sentirem capazes para assumir uma maternidade que não é desejada. Cabe-nos a todos e todas, no dia 11 de Fevereiro de 2007, dizer Não! ao aborto clandestino, dizer Não! a uma sociedade punitiva e julgadora, dizendo SIM! à despenalização da interrupção voluntária da gravidez até às 10 semanas, por decisão responsável da mulher! Eu voto SIM!

Porque são uma das minhas paixões...